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quarta-feira, 16 de março de 2016

Ana Catarina

Não sei mais o que fazer. Minhas atitudes já não condizem com a minha razão. Não me lembro quando perdi a razão, mas perdi. Há muitos anos, muitas coisas aconteceram sucessivamente na minha vida: meu pai foi preso, minha mãe ficou acamada, meu irmão foi assassinado e eu me casei muito nova. Não sei se o amava ou se queria me sentir protegida. Porém, não foi o que aconteceu. 
A nossa diferença de idade era muito grande, ele tinha ciúmes de mim e eu quase não saía de casa. Quando tive filhos, aí que me senti mais aprisionada, não tinha tempo para nada, só cuidava das crianças. Quando adolescentes a situação piorou: meu filho começou a usar drogas, quase não aparecia em casa. A minha filha ficava em casa comigo, via a revolta no rosto dela mas meu marido não permitia que ela saísse ou namorasse. Com o tempo, ela passou a ficar introvertida, quase não conversava. Sabia que algo estava acontecendo, mas ela se fechava cada dia mais e não conversava comigo. Eu a amava, queria protegê-la mas não consegui. Um dia ao voltar da escola, ela desapareceu. Até hoje não sabemos se ela fugiu ou foi morta. Tentamos ajuda, mas nada tinha para ser feito. Comecei a me sentir sozinha. Meu marido passou a chegar tarde e algo dentro de mim, dizia que ele estava me traindo. Tentei abordar o assunto algumas vezes, mas ele era um homem muito ignorante, sempre acabava com ele me violentando.
Hoje eu sei o quanto fui permissiva, mas na época era algo de sobrevivência. Eu não tinha ninguém, não tinha para onde ir, não sabia como sobreviver longe dele. Então simplesmente, aceitava. Com o tempo e com a ausência de todos dentro de casa, a solidão foi muito forte. Comecei a fazer coisas que me arrependo profundamente, dei vazão a minha frustração num monte de vícios. Me tornei dependente das coisas erradas. Minha vida foi se destroçando a minha frente. Já não tinha controle de mais nada. Não me reconhecia. Meus sofrimentos eram aliviados com a minha fuga. Arrependo das minhas escolhas, sei que não sou vítima da vida, mas de mim mesma.

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