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sábado, 11 de abril de 2015

Amélia

Há muito tempo que não falo. Num determinado momento da minha vida, simplesmente parei de falar. Sempre via as pessoas cometendo erros e me preocupava com elas. Com isso, tentava mostrar que o caminho deles não era aquele, que as atitudes estavam erradas e que deveriam de alguma forma tentar consertar o que haviam feito. Todos me ignoravam. Uns nem ouviam, os outros que com muita má vontade paravam para escutar, nunca seguiam os meus conselhos e sempre me magoavam com o que diziam.
Chegou uma hora que me senti cansada. Parecia que nada fazia sentido e quanto mais eu os alertava, pareciam que mais malefícios eles faziam. Não sei se era para me mostrar que eu não mandava na vida deles ou se as minhas palavras tinham efeito inverso. Comecei a me questionar e acreditar que quem estava machucando as pessoas de forma indireta era eu.
Me enchi de pânico. Comecei a me sentir incapaz, sem fé, sem esperanças. Um vazio começou a crescer dentro de mim, já não confiava em ninguém e não tinha vontade de fazer muitas coisas. Com o tempo passei a escutar o que eles tinham para me dizer, balançava a cabeça com o intuito de dizer que estava concordando com a fala, mas na realidade só queria que tudo acabasse.
Não sei quanto tempo passou, mas comecei a me sentir realmente doente. Já não pronunciava uma palavra e meu corpo só pedia cama. Adorava dormir. Era o momento que realmente me sentia em paz, quando acordava tinha tanto pânico do que vivia que só queria dormir de novo.
Meu maior erro foi achar que poderia me medicar sozinha. Com tudo isso não me lembrava mais do momento que estava acordada. Passava a maior parte do dia dormindo. Já não comia, não fazia minha higiene pessoal, apenas vivia do prazer que sentia: o sono.
Não me lembro o dia certo que tudo isso mudou. Um dia acordei e vi que não estava mais no meu quarto. Senti um conflito tão grande de sentimentos que só chorava. Não sabia ao certo o que tinha acontecido comigo. Estava sozinha, num lugar fechado, amarrada na cama e não escutava barulho de nada.
Com o tempo, percebi que numa determinada hora do dia, alguém entrava neste quarto, conversava comigo, trocava os meus lençóis e me medicava. Descobri que gostava dali. Parecia que as pessoas me conheciam e me deixavam ser quem eu queria ser. De alguma forma, senti que estava sendo cuidada. Não sabia o que estava acontecendo, não sabia aonde estava e nem como fui parar ali. Não sabia dos meus familiares, muito menos da minha casa. Com o tempo nem me lembrava que havia tido uma família.
Nada podia fazer, não tinha como perguntar. No momento que estava acordada, tentava emitir algum som, mas nada era produzido. Me tornei um ser incomunicável. A sensação era horrível, comecei a me sentir impotente. Nestes momentos de súbita consciência, a minha angústia era tanto que acredito expressar de alguma forma esta dor, porque quando isso acontecia, essa pessoa que entrava em meu quarto, se aproximava e me dizia: - fique calma, vai passar. Com a injeção injetada na minha veia, voltava a sentir aquele conforto de paz.

Não sei quantas vezes isso aconteceu, nem sei dizer por quanto tempo permaneci ali. Só sei que vivi um antagonismo comigo mesma durante anos. Estava cansada daquela situação. Já passava da hora deste quadro mudar. E mudou.

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