Eu cresci sem a presença do meu
pai. Sempre imaginei como seria se ele estivesse comigo: me levaria à escola,
iria nas festas familiares, comemoraria o meu aniversário, poderíamos brincar,
conversar e até sair juntos. Idealizei-o ao meu lado sendo pai e um grande
amigo. Todos estes anos culpei a minha mãe por ter me afastado dele. Nunca parei
para ouvir os seus motivos por tais decisões.
Quando fiz 13 anos decidi que
faria de tudo para encontra-lo. Comecei a vasculhar os pertences de minha mãe
para encontrar alguma pista. Ia sondando amigos e familiares para saber quem
ele era e onde ele poderia estar.
Lembro que um dia ouvi uma
conversa da minha tia com a minha mãe. A minha mãe não sabia que eu estava em
casa e a minha tia dizia a ela que mais cedo ou mais tarde, eu teria que saber
a verdade.
- Verdade? Você só pode estar
brincando Odete. Disse a minha mãe.
- Não Eugênia. Sua filha está
crescendo, você sempre omitiu a verdade dela e ela coloca aquele monstro como
um herói.
Monstro? Quem é a minha tia para
falar do meu pai daquele jeito. Quase que no ímpeto já estava indo para a sala
tirar satisfação com a minha tia, porém, como a minha mãe continuou falando, me
contive e deixei-me ouvir o que ela tinha para falar.
- Odete e você quer que eu falo o
que? Olha minha querida filha, o seu pai que você sonha a vida inteira, nunca
te quis. Primeiro quando estava grávida, ele me machucou para que eu a
perdesse. Depois quando você nasceu, ele nos manteve em cárcere, depois ele
tentou te matar envenenando o leite que você tomava. Como se não bastasse, no
dia que você passou mal e eu gritei o quanto pude para que os vizinhos ouvissem
e pedissem socorro, fui espancada e quase morri por tentar te salvar.
Essas palavras percorreram o meu
corpo e esmagaram o meu peito, lágrimas caíam sob o meu rosto. Estava
indignada. Como pude ser tão cruel com a minha mãe? Foi por isso, que ouvi uma
certa vez a minha avó dizer que éramos fortes, éramos sobreviventes. Sempre achei
que fosse uma brincadeira ou um modo de dizer. Hoje entendo o que ela se
referia.
Infelizmente não deixei que o
assunto terminasse ali. É claro que fingi não ter escutado a conversa, mas a
guardei por longos anos. Nos seis anos que se sucederam não falei mais sobre o
meu pai, mas alimentava um ódio por ele a cada dia. Fui aos poucos descobrindo
quem ele era, onde estava e o que fazia.
Numa tarde saí com uma mochila
nas costas, com o dinheiro que havia juntado e coloquei o pé na estrada. O dia
enfim chegara e com ele a prestação de contas de toda uma vida.
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