Presenciei a violência em todos
os momentos da minha vida. Morei num bairro de alto risco onde convivíamos com
pessoas drogadas, alcoolizadas, ladrões e matadores de aluguel. Foram várias
vezes quando criança acordava com os tiroteios, pessoas gritando, minha mãe nos
escondendo e tentando de alguma forma nos proteger. Enquanto crescia, sempre
ouvi a minha mãe tentando nos dar um caminho digno a se seguir.
A minha estória é assim: meu pai
foi preso quando eu tinha acabado de fazer 4 anos, eu tinha mais cinco irmãos
mais velhos e a minha mãe tentava de tudo para que nada nos faltasse. Meu irmão
mais velho que na época tinha 12 anos ao ver o sofrimento da minha mãe, acabou
entrando no mundo do crime. Minha mãe fez de tudo para convencê-lo a não ir
para este caminho, mas não teve jeito. Parece que ele nascera para seguir este
caminho.
Por um lado, resolveu bastante.
Nada nos faltava. Mas pelo outro lado, não aguentava ver o sofrimento de minha
mãe. Quantas noites ela passava em claro, orando e pedindo que ele voltasse
para casa vivo.
Meu segundo irmão, o Benedito de
11 anos, foi morar com os meus avôs paternos. Ele queria morar na roça e
trabalhar com os animais. Minha mãe mesmo não querendo deixar, achou melhor que
ele fosse para sair daquele ambiente.
A minha irmã Carlota com 9 anos
era a que cuidava da gente quando a minha mãe saía para trabalhar. Alguns anos
depois ela conseguiu um trabalho de doméstica e foi morar na casa dos patrões.
O quarto dos irmãos era o
terrível Filipe, com 8 anos ele já botava terror. Não parava quieto e sempre
caçava brigas. Na maioria das vezes ele vencia, noutras, ele chegava todo
machucado. Minha mãe sempre dizia para ele não se meter em brigas que um dia
aquilo ainda o mataria. E realmente, foi assim. Aos dezessete anos quando ele
estava numa danceteria depois de uma briga iniciada, ele acabou morto com 3
tiros nas costas. Foi um dos momentos de mais sofrimento na vida da minha mãe.
Já o Artur era bem companheiro,
na época com seus 6 anos, sempre esteve presente nos momentos difíceis e
buscava ajudar. Acho que ele era o mais parecido com a mamãe. Apesar de sua
fragilidade que o deixava sempre doente, aos 15 anos ele já fazia parte de um
programa do nosso bairro que trabalhava com os jovens para tirá-los da rua. Com
o passar dos anos, ele se tornou o presidente desta ONG.
Quanto a mim, acho que nasci para
ter uma vida boa. Sempre gostei de comer bem, vestir bem e de estar sempre
arrumada. Meu irmão mais velho, o Joca (como era conhecido por todos) sempre
cobria os meus luxos. E eu adorava. Quando cresci, comecei a namorar o amigo
fiel do Joca. Como eles trabalhavam juntos, continuava tendo o que sempre
gostei. Quando fui morar com ele, eu estava no topo. Tinha tudo. Saíamos sempre
para ir as baladas.
Com o tempo engravidei. Foi um
atrás do outro. Tive 4 filhos. Quando o meu caçula tinha 4 anos, o Adriano (meu
marido) foi preso. Na época, não percebi a ironia do destino. Sem nada temer e
com medo de passar os mesmos problemas que a minha mãe, assumi o trabalho do
Adriano. Em pouco tempo, já era conhecida, temida e meus trabalhos eram os
melhores. Enriquecia cada dia mais e meus filhos estavam tendo uma ótima vida
como sempre tive.
Depois de uns cinco anos, estava
indo tão bem que assumi a região de trabalho do meu irmão. Interferi drasticamente
no seu trabalho. Como não temia nada, nem ninguém e como sabia lutar pela minha
sobrevivência, acabei destruindo-o financeiramente e moralmente. Numa noite de
Natal ao ir visitar a minha mãe, encontrei-o por lá. Mesmo ela fazendo de tudo
para que não nos tombássemos, não teve jeito, tivemos o nosso acerto de contas
por lá mesmo.
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