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quinta-feira, 9 de abril de 2015

Luara

É horrível viver num lar onde não se tem respeito por ninguém. Meu pai era alcoólatra e sempre que chegava alterado em casa batia na minha mãe. A minha mãe para conter a frustração de viver num casamente falido, abusava dos remédios. Passava grande parte do dia na cama, dormindo. Ela era uma boa pessoa, mas nunca teve forças para tomar uma atitude.
A minha irmã mais velha, passou a dirigir a casa. Ela tinha grandes responsabilidades sobre nós. Sacrificou toda a sua vida para nos servir. Na doença do meu pai, antes dele morrer de enfisema era ela que cuidava, medicava e o levava aos médicos. Da morte de minha mãe ela fez o mesmo. Estava há todos os momentos ao seu lado, dava uma palavra de conforto e sempre lia um trecho da bíblia para trazer um pouco de paz à aquele coração atormentado.
Na ausência deles, ela começou a trabalhar para sustentar a casa. Nos deu estudos, comida e o máximo de atenção que podia. Nos ensinou o que é certo e o que é errado. Meu irmão Richard aos 18 anos se casou e mudou para uma cidade próxima a nós. Com o tempo, perdemos contato.
Katlen resolveu ter uma vida diferente, foi para a capital em busca de oportunidades. A última notícia que tivemos dela, foi que ela havia se casado e tinha um bom trabalho. 
Com os anos, ficamos eu e a Louise. Eu estudava, porque ela mandava, mas não gostava. Adorava os fins de semana para ir à balada. Não queria compromissos, afinal tinha muito medo de me tornar o que a minha mãe tinha sido. E assim foram passando os anos. Louise trabalhando e eu gastando. Chegou uma época que dormia durante o dia para sair à noite. Louise fez de tudo para que eu mudasse, mas não tinha jeito, eu não queria mudar.
Quando Louise fez 39 anos, ela teve derrame. Chorei muito achando que ia perdê-la, afinal era a única pessoa da família que eu tinha próxima de mim. O que sinto foi não ter retribuído a ela, o que fez por mim durante todos os anos que ela abdicou da sua vida para nos servir. Era muito egoísta para pensar em alguém. Quando vi que ela não podia mais trabalhar e que ficaria acamada, resolvi ir embora, não queria trabalho. E com isso, nunca mais voltei.
Quando soube da sua morte, que deve ter sido terrível (sozinha, se definhando e sem recursos) me senti mal, mas o que podia fazer? Nada. Não tinha dinheiro e com certeza também não tinha coração. Ela acabou sendo enterrada como indigente. Depois, retornei para a casa para recuperar o que era meu de direito.
Achei que tinha ganhado na loteria, como me diverti. Acreditei ter tido os melhores anos da minha vida. Era muito bom fazer o que eu quisesse, na hora que quisesse, da forma que quisesse e ter uma casa que era toda minha. Só não imaginava uma coisa: a vida me faria cobranças que eu nunca imaginara.

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